Educação ineficaz

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O ministro da Educação já deu clara sinalização: a alfabetização de adultos é importante, continua reconhecida como parte da dívida social, deve ser resgatada, mas não pode ser a prioridade.

O ministro da Educação já deu clara sinalização: a alfabetização de adultos é importante, continua reconhecida como parte da dívida social, deve ser resgatada, mas não pode ser a prioridade. Até aí tudo bem. Mas também não dá para acreditar que, num país com tantos problemas no ensino básico, a reforma universitária se converta em prioridade maior do MEC. Mesmo porque, por incrível que pareça, não é aí que residem as maiores ineficiências da educação nacional. Nem as maiores injustiças. O ministro também já sinalizou sua preocupação com desperdícios, ao denunciar o custo da reforma de seu gabinete, orçado em 120 mil reais. Ele vai se assustar bem mais quando analisar o desperdício anual causado pela falta de uma adequada política de alfabetização de crianças. Em 2003 matricularam-se 5,8 milhões de crianças na primeira série do ensino fundamental, mas só havia 3,2 milhões de crianças de 7 anos: desperdiçamos 2,6 milhões de vagas, ou seja, mais de 2 bilhões de reais. Na segunda série o desperdício foi de quase 1,5 bilhão. Sistemas escolares expandem o ensino fundamental de 8 para 9 anos sem assegurar programas eficazes de alfabetização ou sem alterar seus programas de ensino, diluindo os recursos do Fundef. Em 15 de setembro de 2004 a Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados apresentou ao país um relatório sobre alfabetização infantil. O ministro leu esse relatório, declarou à comissão que o considera uma contribuição importante e designou um dos seus principais colaboradores para dar início a um processo de debate sobre a alfabetização das crianças.

O relatório divide-se em quatro partes. Na primeira apresenta uma revisão do conhecimento científico sobre alfabetização. Na segunda ilustra as políticas e práticas de alfabetização de alguns países. Na terceira analisa a situação brasileira, e afirma, sem subterfúgios, que o Brasil é a ovelha negra, optou por uma concepção de alfabetização não-científica, de base ideológica, e que é comprovadamente equivocada e ineficaz. O documento analisa os problemas que o Brasil tem para definir o que seja alfabetizar, para lidar com a questão de métodos, de materiais, de formação de professores e de avaliação da alfabetização. Na realidade todos os problemas derivam de um só – a definição equivocada do que seja alfabetizar. Na quarta parte o relatório apresenta uma série de sugestões.

O silêncio das autoridades, dos especialistas e da comunidade acadêmica sobre esse relatório revela a apreensão de pessoas que foram responsáveis por esse estado de coisas e podem estar se sentido acuadas ou arrependidas por tentar impor ao país uma concepção de alfabetização politicamente correta, mas cientificamente equivocada. Embora formalmente convidadas pela Comissão de Educação da Câmara a se manifestar, instituições como o Conselho Nacional de Educação, o Consed, a Undime e as instituições universitárias preferiram o silêncio. Apenas a Academia Nacional de Ciências compareceu, elogiando a qualidade do relatório. O MEC tem papel importante – pois foi ele quem sacramentou as atuais diretrizes sobre alfabetização e as dissemina por meio de orientações e políticas de capacitação e escolha de materiais didáticos. Não se trata de julgar os erros do passado, mas de acertar os ponteiros e olhar para a frente. Nada melhor do que usar as regras do debate científico para analisar a questão. Resta esperar que o debate se inicie logo e de maneira correta, e que não tardem as ações e incentivos para colocar a alfabetização das crianças como a prioridade número 1 das políticas educacionais do país. Até lá continuaremos a alimentar as estatísticas do analfabetismo com 2 milhões de analfabetos funcionais que saem das quartas e das oitavas séries do ensino fundamental.

Fonte: João Batista Araújo e Oliveira

 

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