A Reforma Tributária e os Prejuízos para o Nordeste

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Tema sobre Reformas Administrativas do governo.

O governo federal está em vias de enviar ao Congresso Nacional duas importantes reformas constitucionais: a Tributária e a da Previdência. É louvável o espírito público do Presidente Lula ao se empenhar na aprovação desses dois instrumentos essenciais ao futuro da economia nacional. Há contudo, um contexto extremamente preocupante na formulação do projeto de reforma tributária: é o risco de se engessar de modo irreversível as desigualdades regionais brasileiras. Como tenho certeza que essa jamais seria a intenção de Lula – pois ele é o primeiro presidente retirante das secas, além do fato de que seu principal compromisso de governo é a erradicação da miséria – acho pertinente tecer algumas considerações, como modesta colaboração à análise do Presidente.
Pode-se afirmar, sem medo de errar, que o século XX, aquele onde ocorreria a industrialização brasileira, foi o século de São Paulo. Graças a isso, aquele estado daria tal salto de desenvolvimento, que no início deste milênio chegaria a um patamar de distância ante os demais estados brasileiros sem paralelo nas demais economias do mundo, seja no campo industrial, financeiro, tecnológico e agrícola. Evidente que muito desse resultado decorreu do talento, da competência, do empreendorismo e da capacidade de trabalho do valoroso povo paulista. Mas apenas esses méritos não seriam suficientes. Foi decorrência, por igual, da implantação de um modelo de desenvolvimento que privilegiou maciçamente o pólo industrial do Sudeste, com uma política tributária que, ao contrário do que acontece nas sociedades desenvolvidas modernas, favoreceu ao estados industrializados em detrimento dos consumidores e, sobretudo, submeteu a sacrifícios as demais unidades da federação – especialmente do Nordeste.

As primeiras décadas do século passado foram marcadas pela política “café com leite”, em que paulistas e mineiros se alternavam na Presidência da Republica. Como a economia paulista, por conta do “boom” cafeeiro, era a mais capitalizada do país, somada aos naturais benefícios da presença de paulistas à frente da nação, esse foi um período benéfico para que a incipiente industrialização brasileira se concentrasse em São Paulo.

A partir daí vieram outros períodos da vida política brasileira onde São Paulo continuou sendo privilegiado em detrimento dos demais estados do país. Na longa permanência de Getulio Vargas no poder, por exemplo, foi implementado um vigoroso processo de industrialização planejada, com o Estado desempenhado o papel de investidor. Para sustentar esse processo industrial, Getulio desenvolveria uma política tributária em benefício prioritário dos estados industrializados. Claro que o Sudeste, com a predominância de São Paulo, estava mais estruturado para capitalizar em seu benefício aquele que seria o primeiro grande ciclo industrial brasileiro.
Até aí os livros de História explicam esse modelo de industrialização. Mas o que ninguém faz referência é o fato de que esse processo de desenvolvimento paulista não seria possível sem o expressivo salda da balança comercial do Nordeste brasileiro. Explica-se: para São Paulo industrializar-se, foi preciso que o estado ficasse por décadas seguidas deficitário em suas relações de trocas com o exterior. Necessitando desesperadamente do excesso de dólares obtidos pela venda de produtos nordestinos, para pagar a importação de equipamentos industriais indispensáveis à sua industrialização.

A seguir viria a 2ª fase industrial, com Juscelino Kubitscheck trocando a ênfase das estatais pela atração das grandes multinacionais. Claro que, àquela altura, São Paulo tinha uma melhor infra-estrutura de rodovias, ferrovias, centros de pesquisas e mercado consumidor para sediar esses gigantes industriais. Continuaria inalterável o binômio: política tributária favorecida e déficit paulista compensado pelo Nordeste.
O mesmo ocorreria no regime militar, que além de manter a filosofia anterior, passou a privilegiar os grandes conglomerados financeiros, provocando a partir daí uma nova e perversa concentração. Assim, além do domínio industrial, o estado passaria a sediar os grandes brancos.
Com FHC, além dos poucos bancos que restavam no país haverem sido quase todos canalizados para São Paulo, chegou-se ao requinte de se extinguir a Sudene, mais um golpe contra a sofrida economia nordestina, consumado sob falsas acusações.

Pois bem, tudo isso é verdade, mas não adiante chorarmos o leite derramado. Nós, nordestinos, temos orgulho da pujança de São Paulo, para o qual o contribuímos, como principais prejudicados da política tributária, com a mão-de-obra generosa do nosso emigrante e a indispensável riqueza da nossa balança comercial. Mas entendemos que é chegada a hora da reversão desse quadro. Acreditamos que a generosidade que o nordestino manifestou com São Paulo no século XX,o paulista haverá de querer retribuir.

Primeiro seria o momento, na nova política tributária que se pretende instituir, de reverter o princípio de cobrança do ICMS, hoje feita na origem do produto comercializado, que deveria passar a ser efetuada no destino, evitando a perversa drenagem de recursos, via tributária, dos estados consumidores em direção aos produtores. Aliás, providência igual a que se processa em todo o mundo.

Mas, pelo que se observa das intenções do governo federal, não é o que se pretende. Ao contrário, o ICMS será unificado e a reforma será “neutra”, i.e. com a arrecadação de todos os estados permanecendo proporcionalmente inalterável dentro dos parâmetros atuais. Ora, daí decorre que o privilégio inaceitável dos estados produtores continuará intocável, o que por si só será um absurdo. Estaríamos garantindo o engessamento de uma injustiça e o agravamento de concentração da riqueza regional.

Ocorre que pelo fato das tarifas de ICMS passarem a ser unificadas não poderá mais existir a denominada “guerra fiscal”. Aparentemente uma medida justa, já que a longo prazo a “guerra fiscal” é prejudicial a todos. Entretanto, é preciso registrar que esta é a única forma dos estados pobres atraírem novos investimentos. A partir da sua inexistência, os estados não industrializados não poderão mais conceder vantagens tributárias diferenciadas e, naturalmente, os novos investimentos se concentrarão nos estados ricos, especialmente São Paulo, que de todos tem as melhores condições de infra-estrutura.

Alega-se que a situação de cobrança do ICMS na origem e no destino será decidida posteriormente, através de regulamentação pelo Congresso. Ora, sabe-se que isso é uma falácia, já que sabe que existem leis que estão para serem regulamentadas no Congresso desde a Constituinte.
Ou o Presidente pensa numa política de compensação clara e imediata para as regiões pobres, um projeto de lei que formule uma política industrial que incentive a instalação de industrias na região nordestina, a ser enviado junto com a reforma tributária, ou sobrevirá a antítese em relação aos seus compromissos de campanha, já que o numero de miseráveis tenderá a aumentar, pois as regiões pobres ficarão proporcionalmente ainda mais pobres. Tenho certeza absoluta que esse não é o objetivo do Presidente Lula, cujo governo aglutina os anseios e esperanças de todos o povo brasileiro.

 

 

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